Quem cuida do cuidador?

Com a transição demográfica e o avanço científico, houve redução de morte por doenças infectocontagiosas, crescimento da longevidade e do número de indivíduos com doenças crônicas, especialmente cardiovasculares, neurodegenerativas e oncológicas, repercutindo em aumento de pessoas com algum grau de dependência para as atividades cotidianas.

O cuidador é quem se dispõe a cuidar da pessoa doente e/ou dependente auxiliando a execução de atividades cotidianas da vida, com ou sem remuneração, tais como: higiene pessoal, alimentação, administração de medicamentos, ida a consultas, bancos ou farmácias, independente da gravidade da doença e fluxo de cuidado. Estes cuidadores podem ser formais ou informais. Os cuidadores formais são os de profissionais de saúde e os cuidadores informais são, muitas vezes, familiares, principalmente do sexo feminino, não remunerados, em muitos casos pouco assistidos, orientados ou treinados para executar essas tarefas.

O cuidado ao familiar acometido por doença ou dependência implica além das tarefas já citadas, resignificar a transformação da pessoa outrora conhecida, lidar com mudança de comportamentos, seja com relação a isolamento, alteração de memória, apatia, agitação ou agressividade do doente, seja hábitos inadequados de higiene ou outras demandas, os quais podem gerar nos cuidadores, especialmente nos informais, sentimentos ambivalentes, como ansiedade, raiva, cansaço, culpa, angústias, duvidas sobre estar desempenhando um bom trabalho, medo e desamparo. Acresce-se a isso a preocupação em herdar a patologia de seu familiar.

O cuidar implica em comprometimentos nos aspectos físico, emocional, espiritual, social, ocupacional e financeiro daqueles que o realizam, podendo ter impacto global bastante negativo, especialmente nos casos em que há sobrecarga do cuidador, pouco reconhecimento e valorização das tarefas desempenhadas. 

O cuidador informal está mais vulnerável ao esgotamento físico e emocional, a piora da autoestima, a subvalorização de suas necessidades, a adiamento de projetos pessoais, a isolamento social, prejuízo ocupacional e financeiro.

Estudos científicos evidenciam que o cuidador possui menor qualidade de vida, inclusive com maior risco para o desenvolvimento de doenças psiquiátricas, como o transtorno de ansiedade e depressão, principalmente quando há maior dependência ou alterações mais graves no comportamento do doente ou ainda quando o cuidador já havia apresentado sintomas psiquiátricos previamente.

Sendo assim, faz-se necessário que o cuidador também seja cuidado! Permitir-se se cuidar e ser cuidado nem sempre é tarefa fácil. Atentar para rotinas e hábitos saudáveis de sono, alimentação balanceada e atividade física regular, aceitar participar de propostas de intervenção psicológica, trabalhos de acompanhamento, grupos de apoio e educação em saúde e aceitar, sem estigmas ou preconceitos, o tratamento adequado de transtorno de ansiedade e/ou depressão, comuns em cuidadores.

Síndrome do Pânico

Lara, 18 anos, prestes a fazer vestibular, de repente, começa a sentir dor no peito, palpitações, coração acelerado, falta de ar e sufocamento intensos, tremores, suor excessivo, náuseas e dores abdominais, tonturas, formigamentos, parecendo que parte do corpo está anestesiada, uma sensação insuportável de que irá morrer; imediatamente procura o pronto socorro, com pressão um pouco alta, logo após o atendimento os sintomas diminuem, fica em observação, realiza os exames necessários, com resultados normais e é informada pelo médico que a crise não tem origem cardíaca, não entendendo o que lhe aconteceu. As crises se repetem, tornando-se cada vez mais frequentes e surgindo um medo intenso de sofrer uma nova crise, isolando-se das amigas para evitar saídas e atividades de lazer, passando a evitar reuniões e lugares fechados ou aglomerações, com medo intenso de sair de casa, dificuldade para ir ao cursinho e estudar em casa. Após longo período de sofrimento, por insistência de sua prima, que já estava em tratamento e sentia-se bem, vai à consulta com psiquiatra e descobre o que está acontecendo: tem síndrome do pânico.

O que é Síndrome do Pânico?

A Síndrome (ou Transtorno) do Pânico é um dos transtornos de ansiedade, ocorre em 2 a 4% da população, geralmente se inicia no fim da adolescência ou no adulto jovem, mais em mulheres, podendo ter um curso crônico e recaídas quando não tratado. É associado à desregulação de circuitos cerebrais e neurotransmissores, especialmente serotonina, à presença de familiares com transtornos depressivos ou de ansiedade, a situações de estresse ou mudanças e à história de traumas na infância.

Caracterizada por crises de ansiedade muito intensa, com frequência sem fator desencadeante, podendo ter uma gama de sintomas psíquicos e físicos, como tremores, sudorese, falta de ar e sufocamento, dor torácica, palpitações e taquicardia, tonturas, sensação de desmaio, náuseas, vômitos, dor abdominal, ondas de frio ou de calor, medo intenso de perder o controle ou enlouquecer, sensação de que está morrendo ou sofrendo um ataque cardíaco. Sem tratamento, os episódios tornam-se muito frequentes e surge o medo de ter novas crises, fazendo com que haja limitação cada vez maior, reduzindo atividades prazerosas e o bem-estar.

Podem ocorrer repetidas buscas por pronto atendimentos ou cardiologistas com resultados dos exames normais e muitas vezes há demora e dificuldade em aceitar a avaliação especializada do médico psiquiatra.

Tratamento

O melhor tratamento é a associação de medicamentos e psicoterapia, atividade física regular, rotina de sono, redução da ingesta de cafeína e estimulantes, exercícios de relaxamento e meditação, entre outros. Há uma variedade de medicamentos disponíveis, com diversos mecanismos de ação e distintos perfis de efeitos colaterais, por isso é fundamental a avaliação psiquiátrica criteriosa para escolher individualmente a melhor opção, visando cessar os sintomas e retomar a qualidade de vida.

Depressão na Gestação e no Pós-Parto: Depressão Perinatal

A depressão Perinatal é caracterizada por início dos sintomas na gestação e/ou em até 12 meses do pós-parto, com maior risco no 2º e 3º trimestres e nos primeiros meses do pós-parto. Apesar de comum, 15 a 20% das gestações e pós-partos (prevalência próxima à do diabetes gestacional), ainda é subdiagnosticada e, por consequência, pouco tratada. Na gestação, além dos sintomas comuns da depressão (tristeza profunda, incapacidade em experimentar prazer, alteração do sono, apetite, libido, atenção e concentração, pensamentos de morte e, em casos mais graves, sintomas psicóticos, ideação e tentativas de suicídio), podem surgir sentimento de culpa e ansiedade exagerados, medo de não dar conta de cuidar do filho ou sensação de que não será uma mãe suficientemente boa; dificuldade em seguir as orientações do pré-natal adequadamente. Dessa forma, não impacta somente a saúde e qualidade de vida da gestante, mas aumenta o risco de ter bebê prematuro e com baixo peso ao nascer.

Após o parto, por conta de componentes biológicos, sociais e psicológicos (oscilações hormonais; fase de adaptação à nova realidade; privação de sono; dificuldades no início da amamentação; dentre inúmeros outros), cerca de 70 a 80% das mulheres experimentam crises de choro, nervosismo e irritabilidade, alteração do apetite e do sono, sensação de que não conseguirá cuidar ou amamentar o recém- -nascido, pouca paciência com parceiro, amigos e familiares: é o chamado “Baby Blues” ou “Tristeza materna”, com início por volta do 3º dia, cessando espontaneamente em torno de 2 semanas.

Em até 20% das mulheres a tristeza se agrava muito e, associados a outros sintomas da depressão, podem apresentar grande dificuldade em experimentar prazer nas atividades de que gostavam e na maternidade e, sentindo-se culpadas por não estarem felizes, muitas tentam minimizar e esconder os sentimentos; o cuidar do bebê pode transformar-se em fonte de ansiedade e sofrimento, com sensação de estar sobrecarregada, sem condições de decidir e resolver os problemas do cotidiano, com prejuízo da qualidade de vida e saúde materna, do vínculo mãe-filho, da amamentação e de outros cuidados essenciais.

Quando os sintomas são importantes, associados à psicoterapia, atividade física e hábitos de vida saudáveis, devem ser usados medicamentos para o controle e remissão do quadro. Há medicações seguras para a mãe e o bebê, tanto na gestação quanto na amamentação, sendo indicada a avaliação por psiquiatra para definir qual seria a mais adequada individualmente. Além do sofrimento materno, a depressão perinatal impacta negativamente no desenvolvimento cognitivo, emocional e físico da criança de forma duradoura, devendo ser rastreada e tratada; no entanto, somente cerca de 15% das mulheres que necessitam obtém tratamento adequado. Se ainda há preconceito com relação aos transtornos psiquiátricos em outros contextos, no período perinatal o problema é ainda maior: um tabu!

Na hora da Prova: Deu branco!

Uma queixa bastante comum entre candidatos em concursos públicos e vestibulares é o esquecimento súbito, popularmente conhecido como “branco”, que pode ocorrer mesmo em indivíduos com bom ritmo de estudos e desempenho adequado em simulados. Comumente tem duração de poucos minutos, porém pode durar alguns dias, tratando-se de um “bloqueio” em recordar um conteúdo aprendido quando solicitado, especialmente em contextos estressantes e de ansiedade, como os presentes nas avaliações.

Se durante a prova “der branco”, procure realizar exercícios para relaxamento e controle respiratório por alguns minutos até redução de ansiedade; escreva toda informação relacionada ao tema da questão que lembrar, mesmo sem relação direta com a resposta; resolva as outras questões e posteriormente retorne para as que não conseguiu finalizar; para alguns candidatos é benéfico mudar o foco (sair da sala para ir ao banheiro, beber água…), outros preferem manter-se continuamente atentos à prova. Participar de simulados pode ser interessante para identificar a melhor estratégia individualmente, além de treinar com resolução de exercícios o conteúdo aprendido e verificar seu desempenho.

Para minimizar o risco desses esquecimentos súbitos nas avaliações é indicado reduzir a ingesta de café no dia da prova, não usar bebidas alcoólicas e outras drogas, organizar um programa de estudos, esgotando os conteúdos e revisando-os com antecedência, não passar madrugadas acordado para estudar, mantendo uma rotina de sono saudável, praticar exercícios físicos regularmente, alimentar-se adequadamente e fazer psicoterapia.

Em alguns casos, além da psicoterapia, há necessidade de avaliação psiquiátrica, especialmente quando esses “brancos” são muito frequentes, associados a sintomas mais importantes de ansiedade ou distúrbios do sono, ou quando as queixas de memória e atenção não se restringem às situações estressantes e de avaliações, prejudicando a consolidação do conhecimento e o desempenho cognitivo, impactando negativamente na qualidade de vida. 

As alterações de memória, atenção e concentração são sintomas comuns à várias condições psiquiátricas, tais como Ansiedade Generalizada, Pânico, Déficit de Atenção, com ou sem Hiperatividade, Depressão, Transtorno Afetivo Bipolar, Dependência de Álcool e outras drogas, assim como condições clínicas, que devem ser descartadas e/ou tratadas adequadamente. Para definir diagnóstico e orientações quanto ao melhor tratamento é importante uma avaliação psiquiátrica com profissional capacitado

Déficit de Atenção e Hiperatividade em Adultos

O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é caracterizado pela desatenção, hiperatividade e impulsividade, com início percebido na maioria das vezes durante infância ou início da adolescência, especialmente no ambiente escolar, porém com prejuízo em outros contextos da vida. Pode ter como apresentação desatenção associada à hiperatividade e impulsividade ou somente predominarem sintomas de desatenção ou hiperatividade.

Apesar de o TDAH ser frequentemente tratado somente na infância e adolescência, cerca de 2/3 dos pacientes mantém os sintomas ocasionando prejuízos na idade adulta, mesmo tentando aplicar técnicas e estratégias compensatórias para lidar com seus déficits e tentar minimizar as repercussões negativas em relação aos relacionamentos interpessoais, sociais, familiares, acadêmicos e profissionais.

A desatenção, hiperatividade e impulsividade se manifestam nos adultos de forma distinta da apresentada na infância e adolescência. Em adultos frequentemente os sintomas de desatenção são: dificuldade em manter foco em atividades monótonas ou repetitivas; ter erros frequentes por desatenção; não completar projetos ou atividades, cursos e faculdades, muitas vezes desistindo após concluir etapas difíceis; evitar ou adiar trabalhos que exijam atenção e concentração; ter dificuldade para manter o ambiente organizado, colocando objetos em locais diferentes ou perdendo-os com muita frequência; esquecer-se de compromissos ou obrigações; esquecer-se de retornar ligações ou dar recados; chegar atrasado, ter pouca noção da passagem do tempo ou precisar do prazo limite para executar os projetos; distrair-se com barulhos ou atividades a sua volta, entre outros.

A hiperatividade e impulsividade podem se manifestar por meio de sensação de agitação e inquietude, dificuldade em permanecer parado, mexendo-se na cadeira, balançando pés ou levantando-se quando deveria permanecer sentado; dificuldade para relaxar, procurando atividades para fazer mesmo no tempo livre; falar demais em situações sociais, interrompendo outras pessoas, terminando suas frases ou respondendo antes de a pergunta ser finalizada; dificuldade em esperar em filas ou no trânsito; buscas por atividades estimulantes e com alto risco, por ex. abuso de drogas, apostas em jogos, entre outros.

Por conta dos sintomas, as pessoas com TDAH não tratadas tem maior risco de não concluir cursos e faculdade, ter trocas frequentes de empregos, falta de controle financeiro, divórcios e términos abruptos de relacionamentos, maior incidência de acidentes de trânsito, dentre outros prejuízos. Além disso, podem apresentar comorbidades com transtorno de ansiedade, depressão, adição por drogas, jogo patológico e compulsão alimentar.

O indivíduo com déficit de atenção e hiperatividade deve ser avaliado para que se defina o melhor tratamento, visando redução de prejuízos, reabilitação e melhora da qualidade de vida.